sábado, 26 de agosto de 2017

Coluna de Lenio Streck sobre os bruxos

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Extraída de O Sul com autorização do autor (http://www.osul.com.br/)

No creo en brujos, pero existen! Si, existen!
Há tempos que muitos torcedores – e até jornalistas  – denunciam o bruxismo nos vestiários e nas escalações. Na verdade, há um comportamento padrão em bruxos. Há os bruxos do chinelinho, que vivem com pequenas lesões... Quase não jogam e acabam sendo emprestados depois de terem custado uma fortuna (e o clube ainda paga parte dos salários). Há os bruxos medalhões, que jogam só no nome, exigem titularidade, mas logo apresentam coisas como dor no púbis e jogam apenas um terço dos jogos. Há os bruxos que lideram, que fazem alianças com técnicos. São a categoria bruxos-cascudos, que fazem uma filtragem acerca de quem pode e não pode subir para o elenco principal e, é claro, quem pode ser titular. E há os bruxos que cansam. Ficam exauridos. Ao contrário de Messi, querem jogar apenas umas 45, 50 partidas por ano. Nos anos 90, os jogadores do Grêmio jogaram, em média, mais do que o Messi. E o time jogou, nesses anos, mais de 90 partidas. 
Dizem que o bruxismo está em todos os clubes e times. Dizem que é inexorável. Que não adianta protestar. Direções de clubes ficam refém, não dos bruxos, em si, mas do imaginário do bruxismo, uma espécie de entidade metafísica que paira sobre todo o plantel. É como no presidio: o diretor manda nada, a polícia manda pouco e quem manda mesmo são os presos. Quem quiser mudar isso cria a tempestade perfeita para um motim.
Dizem-me os meus Amigos que isso não tem cura. É assim mesmo. E que pretender que isso não seja assim é pura ingenuidade. Consta que até Tite é refém de bruxos, todos tem os seus bruxinhos. Pode ser. 
Mas o fato de o senso comum apontar para a falácia de “isso é assim mesmo”, não quer dizer que algo não necessite ser feito para amenizar o poder do rabo do cachorro. Pode até abanar o cachorro, mas, quem sabe, possamos diminuir a intensidade do “arrodiamento”?
O jogador pode até ser bruxo por competência e hierarquia, como Messi. Só que Messi jogou no ano passado 66 partidas. Quantos partidas jogou o bruxo Edilson, para dar um exemplo de um arquétipo? Ou quantas partidas jogou este ano? Isso sem considerar as partidas que muitos protobruxos ou bruxos ficam fora por cartões ridículos ou, quiçá, cartões recebidos... Veja-se: o que a torcida não engole é que, no Brasileirão, em nome da preservação e do cansaço, o Grêmio tenha usado um time com 11 reservas. E de 12 pontos, ganhou 1, com o goleiro (reserva) como a melhor figura. Nem preciso continuar...
Nossos “comandantes do vestiário” – refiro-me, é claro, aos atletas – ganham muito bem. E, muitos, ficam exaustos rapidamente. Isso fez com que, por exemplo, começasse a vingar a tese de que jogadores devem ser poupados. Como a tese fica desgastada com o tempo (e pela comparação com o exterior), inventaram a tese da poupação de acordo com critérios científicos que medem o cansaço (deve ser um aparelho chamado cansômetro).
Claro que cada aparelho tem ajustes particulares. O Cruzeiro deve ter falsificado os dados do seu aparelho, porque, mesmo jogando com os titulares no domingo, fê-los dar o sangue na eliminação do Grêmio. Bingo. Eis uma boa saída. Adulterar os índices do “cansômetro”.
Talvez seja a hora de começar a discutir os limites do poder do vestiário. Futebol não é só gestão de cansaços ou administração de idiossincrasias de bruxos. Há milhões de torcedores que trabalham de sol a sol e pagam ingressos caros e mensalidades ainda mais caras. Pegam quatro ônibus para trabalhar e ainda vão torcer nos estádios. E aí vem o atleta e diz: estou exaurido. Joguei até agora 34 ou 35 jogos. Poxa. Por que não foi fazer outra coisa na vida? Por que jogadores que jogam 66 ou mais jogos por ano, ganham vários títulos e não tem fisgadas e/ou dores musculares que “exigem” paradas para recuperar o tônus ou coisas assim?
Podem criticar este artigo. Não conheço vestiário, dirão. Mas fatos existem. Sou do século XIX: acredito em fatos e não em pós-verdades. E fatos dizem:  direções (o clube) são cada vez mais reféns dos jogadores. Dizem que o Inter tentou enquadrar alguns e foi para a segunda divisão. Capitulou. Diz-se também que o bruxismo já é direito adquirido dos jogadores. 
Avisem o torcedor disso tudo. Dizem também que vestiários e bastidores de clubes é como salsicha: melhor é não ver ou saber como são feitas. Interessante: as leis também são assim.